Eu tenho a honra de trazer à vocês, quase com exclusividade, um conto premiado, escrito pela Carla Ceres, que ganhou como o melhor conto de Piracicaba no 9º Pêmio Escriba de Contos, realizado este ano (2016). Ele tem tudo a ver com nosso mês do Halloween e por isso, aqui está:
Parecia desrespeito ir ao asilo, importunar a viúva do agiota, mas Fernando precisava do empréstimo por um motivo nobre. Não tinha cabimento um jovem belo, forte e de futuro (sim, alguém como ele) não ter futuro nenhum por falta de dinheiro. Precisava aparentar o sucesso almejado antes de obtê-lo. Dinheiro atrai dinheiro. Negócios da China só aparecem para quem tem ou parece ter posses, não é?
Dona Rosália chegou sorridente. Usava um vestido discreto, mas caro. De seu braço pendia uma bolsa de verniz preto, combinando com os sapatos. Estava pronta para ir à missa. Escutou Fernando atentamente. Por fim, estabeleceu as condições para conceder-lhe o empréstimo. O rapaz ficou pensativo.
- Fechamos negócio então? - perguntou a velhinha, bebericando seu chá.
- A senhora não me leve a mal, por favor... eu sei que seu falecido marido era um grande... um grande...
- Banqueiro informal
- Isso! Banqueiro informal. Seu marido foi um grande banqueiro informal, mas nem ele cobraria esses 10% a mais.
- De fato. Com a morte do meu marido os custos operacionais no ramo de empréstimos subiram um pouco. O senhor veja: meu marido era um homem forte, que podia resolver certas pendências pessoalmente. Quanto a mim, mesmo sabendo atirar, prefiro confiar em profissionais. Minha vista anda fraca e eu poderia, sem querer, alvejar alguém de sua família. Seria uma pena. Aceita um biscoitinho de gengibre?
- Não, obrigado. Quer dizer que esses 10% são para algum sujeito atirar em mim?
- De jeito nenhum! Eu só contrato especialistas em artes marciais e armas brancas. Para algum reles sujeito atirar no senhor, bastaria muito menos.
- Entendo. Então acho que prefiro um não-especialista.
- Um não-especialista!? Prefere um amador!? O senhor é quem sabe. Admiro sua coragem, sua confiança de que poderá me pagar toda a quantia no dia combinado, impreterivelmente.
- Eu vou pagar.
- Claro que vai. Qualquer um pagaria se soubesse que tem um psicopata sádico no seu encalço. É pagar e rezar.
- Rezar pra quê?
- Pra que o amador não pegue seu dinheiro e, ainda assim, resolva fazer picadinho com o senhor, por diversão.
- A senhora está me assustando.
- Estou sendo honesta. Pense nos 10% como um seguro de vida. O senhor será visitado em domicílio, por um profissional bem vestido, dirigindo um veículo de porta-malas confortável.
- Por mim ele poderia vir de ônibus.
- Imagina! Aos melhores, o melhor. Um profissional estressado, com baixa autoestima poderia quebrar mais que seus dedos. Além disso, ônibus urbanos não têm porta-malas. O senhor não iria querer ser levado pro cativeiro amarrado no para-choque, não é?
- Cativeiro?
- Apenas até sua família quitar a dívida. Seu chá esfriou.
- A senhora acaba de me dar uma ideia. Parece que seria mais fácil eu sequestrar a senhora.
- Parece é?
- Seus filhos pagariam o que eu pedisse.
- Então vamos - disse a viúva, levantando-se e ajeitando o vestido.
- Pra onde? - perguntou Fernando, estupefato.
- Pro cativeiro.
Dona Rosália pegou a bolsa e virou-se para o espelho como quem verifica o penteado. Quando voltou a encarar Fernando, a agiota segurava uma pequena pistola negra, fosca e elegante, combinando perfeitamente com a bolsa de ir à missa.
Fernando saltou, derrubando a cadeira e fugiu. Dona Rosália, fiel aos ensinamentos do marido, foi até a janela e atirou. “Nunca saque uma arma se não estiver pronta pra usá-la”, dizia o falecido.
O tiro pegou de raspão. Dona Rosália desistiu da missa. Mandou a secretária marcar consulta urgente com o oftalmologista.
Parecia desrespeito ir ao asilo, importunar a viúva do agiota, mas Fernando precisava do empréstimo por um motivo nobre. Não tinha cabimento um jovem belo, forte e de futuro (sim, alguém como ele) não ter futuro nenhum por falta de dinheiro. Precisava aparentar o sucesso almejado antes de obtê-lo. Dinheiro atrai dinheiro. Negócios da China só aparecem para quem tem ou parece ter posses, não é?
Dona Rosália chegou sorridente. Usava um vestido discreto, mas caro. De seu braço pendia uma bolsa de verniz preto, combinando com os sapatos. Estava pronta para ir à missa. Escutou Fernando atentamente. Por fim, estabeleceu as condições para conceder-lhe o empréstimo. O rapaz ficou pensativo.
- Fechamos negócio então? - perguntou a velhinha, bebericando seu chá.
- A senhora não me leve a mal, por favor... eu sei que seu falecido marido era um grande... um grande...
- Banqueiro informal
- Isso! Banqueiro informal. Seu marido foi um grande banqueiro informal, mas nem ele cobraria esses 10% a mais.
- De fato. Com a morte do meu marido os custos operacionais no ramo de empréstimos subiram um pouco. O senhor veja: meu marido era um homem forte, que podia resolver certas pendências pessoalmente. Quanto a mim, mesmo sabendo atirar, prefiro confiar em profissionais. Minha vista anda fraca e eu poderia, sem querer, alvejar alguém de sua família. Seria uma pena. Aceita um biscoitinho de gengibre?
- Não, obrigado. Quer dizer que esses 10% são para algum sujeito atirar em mim?
- De jeito nenhum! Eu só contrato especialistas em artes marciais e armas brancas. Para algum reles sujeito atirar no senhor, bastaria muito menos.
- Entendo. Então acho que prefiro um não-especialista.
- Um não-especialista!? Prefere um amador!? O senhor é quem sabe. Admiro sua coragem, sua confiança de que poderá me pagar toda a quantia no dia combinado, impreterivelmente.
- Eu vou pagar.
- Claro que vai. Qualquer um pagaria se soubesse que tem um psicopata sádico no seu encalço. É pagar e rezar.
- Rezar pra quê?
- Pra que o amador não pegue seu dinheiro e, ainda assim, resolva fazer picadinho com o senhor, por diversão.
- A senhora está me assustando.
- Estou sendo honesta. Pense nos 10% como um seguro de vida. O senhor será visitado em domicílio, por um profissional bem vestido, dirigindo um veículo de porta-malas confortável.
- Por mim ele poderia vir de ônibus.
- Imagina! Aos melhores, o melhor. Um profissional estressado, com baixa autoestima poderia quebrar mais que seus dedos. Além disso, ônibus urbanos não têm porta-malas. O senhor não iria querer ser levado pro cativeiro amarrado no para-choque, não é?
- Cativeiro?
- Apenas até sua família quitar a dívida. Seu chá esfriou.
- A senhora acaba de me dar uma ideia. Parece que seria mais fácil eu sequestrar a senhora.
- Parece é?
- Seus filhos pagariam o que eu pedisse.
- Então vamos - disse a viúva, levantando-se e ajeitando o vestido.
- Pra onde? - perguntou Fernando, estupefato.
- Pro cativeiro.
Dona Rosália pegou a bolsa e virou-se para o espelho como quem verifica o penteado. Quando voltou a encarar Fernando, a agiota segurava uma pequena pistola negra, fosca e elegante, combinando perfeitamente com a bolsa de ir à missa.
Fernando saltou, derrubando a cadeira e fugiu. Dona Rosália, fiel aos ensinamentos do marido, foi até a janela e atirou. “Nunca saque uma arma se não estiver pronta pra usá-la”, dizia o falecido.
O tiro pegou de raspão. Dona Rosália desistiu da missa. Mandou a secretária marcar consulta urgente com o oftalmologista.
Muito obrigada, Camila, pelo carinho ao receber minha doce velhinha! :) É muito legal estar no seu blog, nesta época. Beijos!
ResponderExcluirQue bom ler Carla Ceres de novo!!!
ResponderExcluirAdorei o conto, surpreendente em muitos momentos, principalmente no final.
Eu pensei que a velhinha quisesse namorar com o Fernando rsrs
Beijos para vocês duas :D :D
Muito obrigada, Regina! :) Beijos!
ExcluirMuito bom!
ResponderExcluirBj e fk c Deus.
Nana
http://procurandoamigosvirtuais.blogspot.com.br/
Obrigada, Nana! :)
ExcluirVai achando q toda velhinha é indefesa kkkkkkk muito bom, parabens a Carla Ceres por escrever esse conto otimo...
ResponderExcluirQue bom que você gostou, Suka! :)
ExcluirEnviamos um convite para o teu email :)
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