Você acredita no bicho papão?
Bem, você deveria, pois ele é real assim como nós... Faz dez anos desde que eu o vi e mesmo depois de tanto tempo não consigo esquecer aquele rosto infernal com olhos amarelos que assombram as minhas noites de insônia.
Meu nome é Cesar, tenho 42 anos, vivo aqui nesse asilo para loucos insanos no meio de porra nenhuma. Escrevo esse texto com giz de cera no verso de um jornal velho, como uma confissão e um aviso. Minha desgraça veio quando Ana, minha esposa, retornou para casa depois de uma cirurgia no apêndice. Tudo parecia normal, mas hoje vejo como fui idiota.
Meu filho, Lu, foi quem me alertou: “Papai, a mamãe não é mamãe, isso daí se parece com ela, mas só parece”. Eu ignorei o aviso, afinal o garoto tinha uma imaginação fértil como qualquer outro de seis anos, mas hoje penso que se eu tivesse prestado atenção, ele ainda poderia estar vivo...
Eu havia notado algumas diferenças em Ana, mas por algum motivo ignorei, hoje acredito que a coisa fez algo com a minha cabeça. Ana havia voltado com uma fome voraz, principalmente por carne vermelha. Certa vez a peguei comendo carne crua e quando ela me viu, lambeu o sangue dos lábios e me beijou antes que eu dissesse algo.
Aquele beijo foi esquisito e me deixou sem ação. Hoje tenho certeza que a coisa me hipnotizou, como um predador diante da presa. O apetite de Ana ia além da fome por comida, ela estava louca por sexo! Fazíamos quase todos os dias, de manhã, à tarde, à noite e de madrugada. Cheguei a um ponto onde eu não aguentava mais e fugia dela matando tempo no trabalho e na rua... Deus! Hoje sei que aquilo com quem eu estava transando não era minha esposa, não era sequer humano.
Tudo teve fim um mês depois em uma madrugada de sábado, eu estava dormindo quando escutei um grito. Acordei assustado, olhei para o lado e a cama estava vazia. Calcei os chinelos e fui rumo ao quarto do Lu. Assim que sai no corredor quase vomitei, o ar estava tomado por um cheiro forte de podridão nauseante que mais parecia bosta de cavalo batida com leite azedo, algo difícil de esquecer.
Segui caminhando com o coração aos pulos debaixo do peito sem saber o que diabos estava acontecendo, e quando parei na porta do quarto do meu filho, fui tomado de pavor e desespero.
O ambiente estava escuro, mas a luz da lua que vinha da janela aberta iluminava o suficiente. No chão estava o cadáver de Lu, a cabeça dele estava torcida para trás e seus olhos vidrados no vazio mórbido me encaravam. O corpo estava com a barriga aberta e sobre ele uma criatura se alimentava sugando as vísceras como se fossem macarrão ao molho italiano.
A coisa era grande, magra e velha, sua pele era cinza e de aspecto doente, o crânio murcho era alongado para trás e mais parecia uma genitália enrugada. O maxilar da criatura era grande e cheio de dentes pontudos semelhantes a estacas de aço. Olhei em volta e o quarto estava tomado por casulos pulsantes que emanavam calor, entre eles estava o cadáver de Ana que parecia uma roupa velha jogada de lado.
Desesperado comecei a gritar e então a coisa parou de comer e olhou para mim. Seus olhos eram amarelos e brilhavam na escuridão como vagalumes, de repente ela abriu a boca e berrou: “SUUUUUBA-RA-SHIIIIIII!”.
Confuso e apavorado sai correndo para o corredor, tropecei e desmaiei no chão. Quando acordei estava cercado de policiais que não acreditaram na minha história. O resto você consegue imaginar. Eles acharam os corpos, mas não viram nenhum casulo, muito menos a criatura.
E as vezes quando almoço ao lado de Napoleão e Mussolini, penso que talvez eu não passe de um louco assassino como todos dizem, mas eu sei o que eu vi naquela noite. Também sei que os casulos estavam cheios de crias da criatura, teriam elas o meu rosto? Espero jamais descobrir.
Escrito por Rodrigo Rodrigues – 21/10/2018.
Você já o conhece. Tem resenha do livro dele "O Pistoleiro da Meia-noite" aqui no blog. E se você se interessou e quer saber mais sobre o autor aqui estão todas suas redes e links para comprar seu livro:
Uai, o bicho papão fala japonês! Parabéns pelo conto, Rodrigo!
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